BRASÍLIA — Nenhum mandante no banco dos réus, nenhuma nota do partido do qual foi um dos fundadores e agora mergulhado na campanha sucessória. Até meio-dia deste 21 de junho de 2010, os 30 anos do assassinato do líder sindicalista Wilson Pinheiro passam quase em silêncio.
Pinheiro foi morto em 21 de junho de 1980 com um tiro na nuca, pelas costas, a mando de latifundiários. Estava reunido numa sala, com outros dirigentes do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Brasiléia, no Acre. Além de presidente do sindicato, também presidia a Comissão Municipal do PT.
Para a compreensão da história de resistência acreana e amazônica, há diversos relatos minuciosos, cada vez mais vivos, na rede mundial de computadores. Se os assessores petistas se dessem ao cuidado de novamente apreciá-los, orientariam parlamentares a lembrar, na tribuna da Câmara e do Senado Federal, o herói de Brasiléia.
Pinheiro não era acreano, mas um amazonense. Em estudo publicado pela Fundação Perseu Abramo, o professor Francisco Dandão Pinheiro, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) em São Paulo , escreve:
”Uma casa de madeira sem pintura, em frente à pequena igreja da cidade, abrigava o Sindicato dos Trabalhadores Rurais local. Ali o trabalho era sempre maior do que o número de funcionários e voluntários para fazê-lo. O presidente, um homem alto, pele queimada pelo sol, mãos calejadas pelo ofício de seringueiro desde os primeiros anos de vida, apreciador de cigarros fortes, incansável na sua faina despedia-se de dois companheiros e resolvia ficar mais um pouco, para resolver alguns assuntos pendentes.
“Estava jurado de morte por fazendeiros da região, mas não dava muita atenção para as ameaças. Sentia-se seguro no seu ambiente de trabalho. Meia hora depois, a confiança de que nada poderia acontecer-lhe mostrava-se vã. De costas para a rua, olhando distraidamente para um aparelho de televisão, enquanto arrumava uns últimos papéis, sentiu a dor súbita de projéteis entrando pelo corpo.
“O silêncio de Brasiléia foi quebrado por quatro tiros. Wilson Pinheiro tombava sem vida. O movimento seringueiro acreano perdia o seu primeiro grande líder. E se desencadeava, imediatamente, uma onda de violência que iria, oito anos mais tarde, mudar a história das relações entre homem e meio ambiente no Brasil”.
“O Sindicato era o local de trabalho dele”
BRASÍLIA — A filha Hiamar de Paiva Pinheiro, ex-vereadora pelo PCdoB em Brasiléia, prestou um depoimento no ano 2000, quando passavam 20 anos da morte do pai. Principais trechos:
“...Éramos oito filhos, sete meninas menores...” “... Lembro de uma vez que meu pai precisou ir a um empate enfrentar pessoas armadas e não tinha sequer um canivete no bolso. Não sei dizer se ele era corajoso ou muito inocente pra fazer isso”.
“...No dicionário de meu pai não existia a palavra covardia. O pistoleiro que assassinou meu pai, sim, era covarde porque atirou pelas costas. Com certeza que se ele tivesse chegado frente à frente meu pai não teria corrido. Ele teria morrido do mesmo jeito, mas não teria corrido”.
“... foi gratificante a luta de meu pai porque levou em consideração o lado humano. Eu tenho muito respeito por essa luta, e se tivesse que voltar tudo novamente eu acharia maravilhoso” “...Quando ele não podia voltar pra casa, o sindicato era o local de trabalho e o local de morar também”
“... Uma semana antes de meu pai ser assassinado eu encontrei com ele.
Era uma segunda-feira, e na outra segunda-feira ele morreu. Ele ainda foi me deixar no caminho da escola. Eu lembro até do último filme que meu pai assistiu... (chorando) Até hoje me pergunto por que ainda não me acostumei. Já se passaram 20 anos... Mas eu não consigo, toda vez é assim.” “... Inspiro-me na luta de meu pai” “Ninguém resgata a luta de ninguém porque cada um já nasce com a sua”.
Era uma segunda-feira, e na outra segunda-feira ele morreu. Ele ainda foi me deixar no caminho da escola. Eu lembro até do último filme que meu pai assistiu... (chorando) Até hoje me pergunto por que ainda não me acostumei. Já se passaram 20 anos... Mas eu não consigo, toda vez é assim.” “... Inspiro-me na luta de meu pai” “Ninguém resgata a luta de ninguém porque cada um já nasce com a sua”.
O Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, do qual ele foi o segundo presidente, surgiu com 890 sócios-fundadores e alcançou quatro mil na época dos “empates” (movimento que impedia peões e capatazes de fazendeiros de derrubar a floresta para a formação de pastagens. Foi o maior fenômeno de organização popular amazônica. (M.C.)
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