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segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Carta a um jovem internauta

Sei que você passa longas horas no computador navegando a bordo de todas as ferramentas disponíveis. Não lhe invejo a adolescência. Na sua idade, eu me iniciava na militância estudantil e injetava utopia na veia. Já tinha lido todo o Monteiro Lobato e me adentrava pelas obras de Jorge Amado guiado pelos "Capitães de areia".

A TV não me atraía e, após o jantar, eu me juntava à turma de rua, entregue às emoções de flertes juvenis ou sentar com meus amigos à mesa de uma lanchonete para falar de Cinema Novo, bossa nova – porque tudo era novo – ou das obras de Jean Paul Sartre.

Sei que a internet é uma imensa janela para o mundo e a história, e costumo parafrasear que o Google é meu pastor, nada me há de faltar...

O que me preocupa em você é a falta de síntese cognitiva. Ao se postar diante do computador, você recebe uma avalanche de informações e imagens, como as lavas de um vulcão se precipitam sobre uma aldeia. Sem clareza do que realmente suscita o seu interesse, você não consegue transformar informação em conhecimento e entretenimento em cultura. Você borboleteia por inúmeros nichos, enquanto sua mente navega à deriva qual bote sem remos jogado ao sabor das ondas.

Quanto tempo você perde percorrendo nichos de conversa fiada? Sim, é bom trocar mensagens com os amigos. Mas, no mínimo, convém ter o que dizer e perguntar. É excitante enveredar-se pelos corredores virtuais de pessoas anônimas acostumadas ao jogo do esconde-esconde. Cuidado! Aquela garota que o fascina com tanto palavreado picante talvez não passe de um velho pedófilo que, acobertado pelo anonimato, se fantasia de beldade.

Desconfie de quem não tem o que fazer, exceto entrincheirar-se horas seguidas na digitação compulsiva à caça de incautos que se deixam ludibriar por mensagens eróticas.

Faça bom uso da internet. Use-a como ferramenta de pesquisa para aprofundar seus estudos; visite os nichos que emitem cultura; conheça a biografia de pessoas que você admira; saiba a história de seu time preferido; veja as incríveis imagens do Universo captadas pelo telescópio Hubble; ouça sinfonias e música pop.

Mas fique alerta à saúde! O uso prolongado do computador pode causar-lhe, nas mãos, lesão por esforço repetitivo (ler) e torná-lo sedentário, obeso, sobretudo se, ao lado do teclado, você mantém uma garrafa de refrigerante e um pacote de batatas fritas...

Cuide sua vista, aumente o corpo das letras, deixe seus olhos se distraírem periodicamente em alguma paisagem que não seja a que o monitor exibe.

E preste atenção: não existe almoço grátis. Não se iluda com a idéia de que o computador lhe custa apenas a taxa de consumo de energia elétrica, as mensalidades do provedor e do acesso à internet. O que mantém em funcionamento esta máquina na qual redijo este artigo é a publicidade. Repare como há anúncios por todos os cantos! São eles que bancam o Google, as notícias, a wikipédia etc. É a poluição consumista mordiscando o nosso inconsciente.

Não se deixe escravizar pelo computador. Não permita que ele roube seu tempo de lazer, de ler um bom livro (de papel, e não virtual), de convivência com a família e os amigos. Submeta-o à sua qualidade de vida. Saiba fazê-lo funcionar apenas em determinadas horas do dia. Vença a compulsão que ele provoca em muitas pessoas.

E não se deixe iludir. Jamais a máquina será mais inteligente que o ser humano. Ela contém milhares de informações, mas nada sabe. Ela é capaz de vencê-lo no xadrez – porque alguém semelhante a você e a mim a programou para jogar. Ela exibe os melhores filmes e nos permite escutar as mais emocionantes músicas, mas nunca se deliciará com o amplo cardápio que nos oferece.

Se você prefere a máquina às pessoas e a usa como refúgio de sua aversão à sociabilidade, trate de procurar um médico. Porque sua auto-estima está lá embaixo e o computador não haverá de encará-lo como se fosse um verme. Ou sua auto-estima atingiu os píncaros e você acredita que não existem pessoas à sua altura, melhor ficar sozinho.

Nas duas hipóteses você está sendo canibalizado pelo computador. E, aos poucos, se transformará num ser meramente virtual. O que não é uma virtude. Antes, é a comprovação de que já sofre de uma doença grave: a síndrome do onanismo eletrônico.


Frei Betto é escritor, autor do livro de contos "Aquário Negro" (Agir), entre outras obras.

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