BRASÍLIA - A pré-candidata do Partido Verde, senadora Marina Silva, criticou, em entrevista exclusiva ao iG, o uso da máquina pública no processo eleitoral. Ela disse que as regras que evitam o favorecimento precisam ser cumpridas e que atos de governo não podem se transformar em verdadeiros comícios. “É preciso termos o devido cuidado, tanto da parte de quem está na máquina, quanto da sociedade, para que não sejam feitas burlas indiretamente, sob o pretexto de que se está fazendo a gestão pública e a fiscalização”, disse: "Lula admite que a base rachou nos Estados, mas quer coesão na candidatura presidencial"
Diante da pergunta sobre o “efeito Marina” na agenda dos candidatos, a senadora Marina Silva admitiu que um tema, relegado a segundo plano, agora é central. Para ela “chegou a hora da questão ambiental”.
Marina criticou o Ministério da Ciência e Tecnologia por não ter divulgado até agora o cálculo de quanto o Brasil emite de gases de efeito estufa em cada atividade econômica, o chamado “inventário de emissões”. Ela tentará convocar o Ministério ao Senado para explicar o atraso dos dados. Segundo ela, não ter essas estatísticas enfraquece a posição brasileira em Copenhague.
iG: Existe mesmo o efeito Marina? A senhora acha que mudou a agenda dos outros candidatos?
Marina Silva: Tivemos, sim, uma mudança na agenda e nas posições políticas. O Brasil estava com esse tema relegado a segundo plano. Eu acho que houve um alinhamento dos candidatos com a agenda estratégica do País. Com a discussão que está acontecendo no mundo: a mudança de modelo de desenvolvimento em função do aquecimento global. Um tema que estava ao largo do processo de 2010 adquiriu centralidade. Eu diria mesmo que o assunto nesse momento, em função de Copenhague, assume o topo da agenda nacional. É positivo. Essa demanda está no mundo inteiro. Pelo trabalho das ONGs, sociedades cientificas, empresários setores do Congresso. Estamos indo com metas. No Congresso podemos instituicionalizar estas metas. O Governo de São Paulo também tem metas. É um ganho histórico para o Brasil. Espero que não seja uma posição só de conjuntura.
iG: A senhora acredita que eles mudaram a idéia sobre a questão ambiental?
MS: A questão ambiental forçou uma inflexão política e nas duas candidaturas. Não vejo isso como negativo. Acho que é positivo. O frei Leonardo Boff me falou esses dias que não tem nada mais forte do que uma idéia cujo tempo chegou. Acho que é o momento em que as pessoas percebem isso. Alguns ainda muito refratários, muito receosos de se aproximar desse tema, como se ele fosse algo que pudesse fazer no fim perder popularidade. Mas esta é a nova demanda social e política. Eu venho dizendo há muitos anos que essa é a utopia desse século. Nós que nos mobilizamos pela democracia - tanto eu, quanto Serra, quanto Dilma -, eles mais pelo preço que pagaram por isso - quando chegou o tempo certo, nós conseguimos. Agora, a hora da questão ambiental chegou. O fundamental de tudo isso é que a sociedade brasileira está nos dando a imensa oportunidade de fazermos as mudanças que os próximos 20, 30 anos exigem de nós. Às vezes, temos que tomar decisões e enfrentar desafios sem o relativo acordo social que nos dê sustentabilidade política para fazê-lo. Nesse momento, há uma grande parte da sociedade que está acenando com a força política para que façamos as mudanças. E não temos o direito de nivelar o Brasil por baixo no debate com os que querem continuar com o mesmo paradigma do século XX e até mesmo do final do século XIX. As pessoas estão nos dando a chance de transitar e, numa campanha política, obviamente que esse acordo social é mais palpável porque a sociedade vai se mobilizar.
iG: A proposta brasileira prevê um corte no que estiver emitindo de gases de efeito estufa em 2020. Ou seja emissões futuras. A Europa prevê corte em relação ao que emitia em 1990. Isso piora a proposta brasileira?
MS: Não temos um inventário atual de quanto emitimos. Nossos números são de 1994. O Ministério da Ciência e Tecnologia tem adiado infinitamente a divulgação desses dados. O governo chegou a um número graças a projeção feita pelo Ministério do Meio Ambiente. Mas ninguém sabe a base de cálculo. O melhor seria pegar 2005 para ter uma idéia melhor do desvio de rota que estamos fazendo. São Paulo está fazendo a conta a partir de 2005. Temos que pegar a base de 2005 e condicionar a um inventário a ser divulgado no ano que vem. E ter novo inventário a cada três anos.
iG: Como podem propor cortar as emissões se não sabem exatamente quanto emite hoje?
MS: Vou fazer, inclusive, um requerimento convidando o Ministério da Ciência e Tecnologia para que dê explicações na Comissão de Meio Ambiente do Senado. Por que esse inventário não é público? A proposta brasileira fica mais frágil quando, em um Fórum Internacional o Brasil, assume compromissos mas sem uma base concreta de dados. Acho importante o Ministério do Meio Ambiente ter feito a projeção na falta dos dados do Ministério da Ciência e Tecnologia.
iG: A campanha de 2010 parece já ter começado. A senhora acha que o Brasil precisa de regras mais claras no uso da máquina das eleições ou o para o momento da pré-eleição?
MS: Nós temos regras para o uso da máquina. O que há necessidade é que as regras sejam cumpridas. É preciso evitar o favorecimento. É preciso termos o devido cuidado tanto da parte de quem está na máquina, quanto da sociedade, para que não sejam feitas burlas indiretamente, sob o pretexto de que se está fazendo a gestão pública e a fiscalização.
Esses atos são corretos e devem ser feitos, mas não podem ser transformados em verdadeiros comícios. Deve haver uma vigilância para que as regras sejam cumpridas. Em relação à pré-campanha, acho que há falta de um regramento e, na ausência desse regramento, quem está na máquina opera no sentido de fazer sempre da sua atuação, em momentos de inauguração, ou outro qualquer, um verdadeiro ato político. E quem não está numa função executiva fica sem saber como operar. Deveríamos ter normas sobre o que os candidatos podem fazer legalmente ou não numa pré campanha.
iG: O ministro Juca Ferreira fez uma crítica à candidatura presidencial do Partido Verde. Na sua opinião ele deveria deixar o ministério?
MS: O Juca é uma liderança importante do partido, ministro da Cultura. Como secretário executivo, fez um trabalho muito importante junto ao nosso querido Gilberto Gil. Tanto fez, que foi o seu sucessor. No início, manifestou suas opiniões e o PV é um partido democrático, que decidiu majoritariamente ter uma candidatura própria. Depois, o próprio Juca, enfim, colocou que ele estava alinhado com o projeto e a decisão da minha filiação e da candidatura ou não. É legitimo que as pessoas tenham suas posições. Foram manifestações depois daquele momento inicial. A decisão de sair ou não do governo, é uma decisão política que ele terá que tomar e o partido, com certeza, fará a discussão de uma forma aberta. Se ele se candidatar, terá que sair. Se não, teremos que discutir como será esse encaminhamento. O fato de estarmos no governo cria uma situação mais complexa para ser manejada. Mas as últimas declarações do ministro Juca têm sido muito de compor com o projeto e buscarmos a melhor forma de caminharmos juntos.
iG: A senhora já decidiu, então, que será candidata...
MS: (Risos) Estamos trabalhando. O partido tomou a decisão de ter a candidatura própria e me colocou como a pré-candidata. Estamos trabalhando nessa direção e a decisão será tomada no ano que vem. Precisamos trabalhar as condições para a candidatura. E, obviamente, que o partido tem se empenhado muito e me sinto honrada de estar nesse lugar.
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